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Série Credo Apostólico – Parte 4: O Redentor no Espaço-Tempo – Bereianos


“…o
qual foi concebido por obra do Espírito Santo, nasceu da virgem Maria, padeceu
sob o poder de Pôncio Pilatos
”.


Muitas matérias de
revistas e artigos na internet trataram do que chamam o “Jesus histórico”. Isto
é um termo para designar aquilo que se disse sobre o Cristo fora da fonte
canônica. Logo, há disparates como o casamento de Jesus com Maria Madalena e
sua viagem à Grécia, onde dialogou com os filósofos da época. Isso tudo não
passa de invencionice, embora seja verdadeira a noção de que Cristo foi alguém
que conviveu na História e se manifestou num espaço geográfico e cronológico no
qual o apóstolo Paulo chama de “plenitude dos tempos” (Gálatas 4.4).

Nunca devemos esquecer que
ao habitar entre nós, Jesus foi um homem judeu do século I, e por isso,
partilhava da aparência e de muitos costumes do seu povo. Como personagem
histórico, é mencionado por autores como o judeu Flávio Josefo e os romanos,
Tácito e Plínio (o moço). Mas é na Escritura que temos a maior informação
acerca do Cristo, sobretudo nos Evangelhos que relatam seu ministério terreno
até a sua morte e ressurreição. No Evangelho escrito por Lucas, por exemplo,
vemos que ele trata sua escrita como um trabalho historiográfico:


Muitos já se dedicaram a elaborar um relato dos fatos que se cumpriram
entre nós, conforme nos foram transmitidos por aqueles que desde o início foram
testemunhas oculares e servos da palavra. Eu mesmo investiguei tudo cuidadosamente,
desde o começo, e decidi escrever-te um relato ordenado, ó excelentíssimo
Teófilo, para que tenhas a certeza das coisas que te foram ensinadas
”. – 
Lucas 1:1-4



Sua narrativa era
endereçada a um homem chamado Teófilo, sobre o qual não temos muitas
informações. Além do evangelho, o livro de Atos dá continuidade ao relato,
objeto de uma acurada pesquisa. Lucas assim escreve ao seu destinatário:


Em meu livro anterior, Teófilo, escrevi a respeito de tudo o que Jesus
começou a fazer e a ensinar, até o dia em que foi elevado ao céu, depois de ter
dado instruções por meio do Espírito Santo aos apóstolos que havia escolhido.
Depois do seu sofrimento, Jesus apresentou-se a eles e deu-lhes muitas provas
indiscutíveis de que estava vivo. Apareceu-lhes por um período de quarenta dias
falando-lhes acerca do Reino de Deus
”. – 
Atos 1:1-3



Como pudemos ler, os fatos
narrados são comprovados por testemunhas oculares, e os relatos foram
repassados via tradição oral. Assim concluímos que o Jesus da Escritura é o
Jesus da História, que habitou entre nós, como um de nós.

O
MILAGRE DA ENCARNAÇÃO

Jesus entra na História
através de um milagre. Ao encarnar, sua concepção não se dá por meio natural.
Maria, uma jovem judia tem em seu ventre um embrião que não é fruto de uma relação
carnal. Jesus foi concebido por obra do Espírito Santo e com isso a profecia do
Antigo Testamento se cumpre (Isaías 7.14).

Algumas pessoas caçoam
desta informação bíblica e chegam a questionar a inteligência de quem crê na
concepção virginal. Detratores do Evangelho já afirmaram que Maria engravidou
de um soldado romano, o que seria ultrajante para ela e para José, seu noivo.
Mas, a tentativa de macular o relato bíblico é fraca de evidências, ficando no
campo da especulação barata. Outra impossibilidade dos zombadores é a de provar
que a concepção sobrenatural não poderia ocorrer. Eles podem até alegar o que
já sabemos: que bebês nascem através do ato sexual de um homem com uma mulher.
Todavia, não podem provar a inexistência de um milagre.

Desde o Iluminismo, nossa
sociedade foi bombardeada pela negação do sobrenatural. Aquilo que os nossos
sentidos alcançam é o que existe – assim falam os naturalistas. Por Natureza,
entende-se o mundo físico que conhecemos e interagimos. Todavia, nosso mundo
criado foi feito por um ente criador, isto é, não criado. Isto quer dizer que a
criação, por si só já é sobrenatural. Logo, não deve haver nenhum estranhamento
quando lemos na Bíblia a intervenção divina no cosmos. Chamamos estas
intervenções de milagres. Em ambos os testamentos, os milagres ocorrem e são
registrados para que tenhamos a noção da grandeza e majestade do Criador. A
concepção virginal é um grandiosíssimo milagre.

Os céticos dirão que as
leis da Natureza são rígidas demais para serem quebradas. Pois bem, um cristão
não negará que existam tais leis. Ninguém em sã consciência vai se atirar de um
prédio de vinte andares para negar que a lei da gravidade está presente no
cosmos. Porém, a existência das leis naturais que regulam o mundo criado não
anula a possibilidade delas serem eventualmente desconsideradas quando o
Criador deseja intervir no espaço e no tempo. Coisas estranhas acontecem com
certa frequência e ferem o que parece ser o lógico para a Ciência. A essas
coisas estranhas dar-se o nome de fenômenos não explicados. Nós, cristãos, preferimos
o termo milagre – ou intervenção Divina.

Ademais, se Deus criou as coisas
visíveis e invisíveis (o mundo Natural e o Sobrenatural) como diz Colossenses
1.16, logo um milagre não seria necessariamente violar a criação, mas sim uma
interação entre as duas realidades existentes e pertencentes à mesma criação.
Ambos os mundos, o visível e o não visível foram criados e são regidos pela Trindade.
Esse argumento respalda a vivência dos milagres no intercurso da História.

AS
DUAS NATUREZAS

A concepção virginal possibilitou
Cristo a ter duas naturezas. Discorrer sobre as duas naturezas do Messias demonstra
o quanto que esta doutrina é essencial para nossa compreensão do Evangelho. De
fato, Jesus foi portador de uma natureza dupla e que não podia ser desassociada
uma da outra. A Singularidade de Cristo está no fato dele ser totalmente homem
e concomitantemente ser totalmente divino. Esse antinômio gerou uma série de
questionamentos e desembocou em muitas heresias.

Em Colossenses 1.15-17, o
apóstolo Paulo, contrariando os mestres heréticos que se infiltraram na igreja
de Colossos, deixa claro o ensino de que Jesus é um ser divino e que não é mais
uma criatura que o Deus-Pai trouxe a existência. Quando se é dito que Jesus é a
imagem (Gr. eikõri) do Deus invisível, a ideia é a de que Cristo não é uma
simples figura representativa. Ele é a manifestação que contém a mesma
substância daquilo que revela. Deus é invisível, e isso é corroborado por outros
autores neotestamentários, mas Cristo, num propósito revelacional é aquele que
projeta Deus para que os homens possam vislumbrá-lo. Tudo que Deus é; igualmente
Jesus é. Mas na frente, Paulo nos diz que “nele
habita corporalmente toda a plenitude da divindade
”. Para que não haja
dúvida de sua divindade, nos é dito que Jesus é “o primogênito de toda a
criação”. O termo que foi traduzido por primogênito não tem relação temporal. Prototokos é, na verdade, um título honorífico,
e ao decorrer do discurso paulino fica evidente a honra que ele concedeu a Cristo:
Porque nele foram criadas todas as coisas
que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam
dominações, sejam principados, sejam potestades. Tudo foi criado por ele e para
ele
”. Jesus é o artífice da criação, tudo partiu dele e foi feito para ele.

Já em Romanos 5.12-19, o
apóstolo Paulo equipara Cristo a um segundo Adão. Enquanto que Adão pecou e, através
da sua transgressão foram encerrados debaixo do pecado – que é mortal – todo o
gênero humano. Da mesma forma, através da morte de Cristo na cruz, muitos
obtiveram o seu resgate e receberam a vida por graça e não a morte por salário.
Se Adão é o cabeça dos homens decaídos, Jesus é o cabeça dos homens redimidos.
No versículo 15, é dito com todas as letras que Jesus Cristo é homem, e por
meio dele, a graça superabundou o pecado. Usando um jogo de contrastes em sua
argumentação, Paulo deixa claro que Jesus cumpriu aquilo que Adão tinha
falhado. Essa é uma teologia pactual. Na medida que Adão desobedeceu a Deus e
fez com que o pecado atingisse todo o cosmos, Jesus, como um servo totalmente
obediente fez aquilo que era o dever do primeiro homem.

O fato de existir no Salvador
duas naturezas, divina e humana, na mesma pessoa, isto é, não são duas pessoas,
mas apenas uma que comporta ao mesmo tempo o status divino-humano é algo que
não podemos explicar racionalmente. Mas lembremos que o inexplicável não
significa impossível. Ademais, a crença na dupla natureza de Cristo nos dá
segurança acerca da nossa fé, sabendo que a justificação é real, pois foi um homem
que morreu pelos pecados dos homens, isto quer dizer, a substituição foi real.
Ao mesmo tempo, tratando-se do Divino, a morte não pode deter o Cristo que foi morto.
Ele ressuscitou por ser Senhor da vida e dos vivos. Porque ele ressuscitou,
temos a garantia de que com ele, também triunfaremos sobre a morte.

CONCLUSÃO

O Credo nos remete a
historicidade dos fatos ao mencionar o nome de Pôncio Pilatos. Esta menção pretende
nos lembrar de que o Cristo que nasceu da virgem e que porta duas naturezas é
um personagem real que apareceu no curso da História. Pilatos foi o quinto
governador da Judéia romana. Foi sob o seu governo que Jesus foi crucificado
(Mt 27.2). Ele foi nomeado pelo imperador Tibério e uma pedra, descoberta
arqueológica de 1963, exposta hoje no Museu de Jerusalém trazia em escrito não
apenas a comprovação da existência de Pilatos, mas clarifica o título que ele
possuía, o de governador.

O que podemos tirar de
proveito desta informação? Podemos estar cientes de que o nosso redentor esteve
neste mundo e passou por experiências que nos são familiares. Ele apesar de não
ter pecado, em tudo foi tentado e padeceu como o homem de dores profetizado pelo
profeta (ler Isaías 53). Assim, ao nos dirigirmos ao nosso Redentor, precisamos
lembrar que ele vivenciou nossos dilemas e esteve à mercê das mazelas deste mundo
caído. Logo, nosso Salvador tem empatia com os que sofrem e entende
perfeitamente o drama dos oprimidos.

Ter um redentor habitando
no espaço-tempo nos possibilita uma maior identificação com Deus, pois, este
Deus conheceu a fundo nossos temores e nossas dores. E a boa notícia é que ele
levou sobre si todas as nossas aflições e nos legou a paz e a reconciliação com
Deus por meio de sua morte e ressurreição.

Soli Deo Gloria

Esse artigo foi republicado com a permissão de Blog Bereianos

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