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O perigo da fama na vida do cristão

João Cruzué

“Sabendo, pois, Jesus que estavam para vir com o intuito
de arrebatá-lo para o proclamarem rei, retirou-se novamente, 

sozinho, para o monte.”
(João 6:15)

Esta semana
estive pensando como escrever uma mensagem sobre a fama e a vida
espiritual. Eu gosto de escrever mensagens que provocam primeiro a
minha mente e depois falam ao meu coração. Se falam comigo, também
podem ser úteis para você. O que a fama tem de tão perigosa que até o
próprio Cristo conscientemente a evitava? Quero compartilhar neste
texto o resultado das minhas reflexões.

Bem cedo em
seu ministério, Jesus sofreu o assédio do diabo propondo-lhe riquezas e fama. Durante aqueles dias de tentação no deserto, o diabo levou-o
para um alto monte, e de lá  mostrou-lhe a glória de todos os reinos
deste mundo e fez uma oferta tentadora: “Tudo isto lhe darei, se
prostrado me adorares.

Eu creio que esse ataque do diabo era fruto de um
planejamento exímio, cuidadosamente revisado por muitos milhares de
anos da experiência maligna na “arte” de derrubar os homens.

Em todos os
três ataques, satã usou das sagradas letras para confundir o Cristo, o
que nos dá uma pequena amostra de que em matéria de teologia o diabo
conhece tudo.  Neste ponto, puxo por um assunto paralelo: nunca na
história da Igreja o conhecimento das escrituras esteve tão à mão,
disponível para quem quiser se aprofundar; são dezenas e dezenas de
enciclopédias, dicionários bíblicos, comentários, bíblias de estudo para
várias correntes de interpretações e vertentes teológicas.

O que tanto
conhecimento pode fazer? Transformar um novo convertido em um doutor em
divindade? Sim! Mas nisso também pode estar uma armadilha do diabo.
Acúmulo de conhecimento não significa acúmulo de sabedoria muito menos andar na presença de Deus.

O excesso de
conhecimento pode inchar as pessoas predispostas à presunção, à soberba
e levá-las à morte espiritual. Entendo que foi nisso que “aquele” querubim
ungido caiu. E também foi enaltecendo o grande conhecimento que havia no
fruto da árvore da ciência do bem e do mal que aquele mesmo “querubim”
trouxe o mal e a morte para desgraça a primeira família de Deus na terra. O Apóstolo Paulo
entendeu isso quando aconselhou a aquisição do saber com temperança, e
não ir além dos limites de cada um.

“Sobre tudo o
que se deve guardar, guarda o teu coração pois é dele procedem as
saídas da vida”. E mais “Enganoso é o coração e mais perverso do que
todas as coisas”
Livro de Provérbios.

O orgulho é um pecado que nasce e
toma forma no coração, até o momento que a pessoa se acha como Deus. O
sucesso e a fama no meio religioso tem servido de âncora e farol para a
idiossincrasia de muita gente. É muito mais atrativo pregar um
“evangelho” que vá ao encontro das necessidades de conforto e riqueza
humanos do que o legítimo Evangelho. A carroça à frente dos bois. Nos
últimos dias do cárcere do apóstolo Paulo em Roma, isto ficou patente.
Paulo morreu sozinho, abandonado e desprezado. Por que? Porque o
evangelho que pregava era “diferente” dos novos “senhores” da Igreja.
Segundo eles, Paulo era um fracassado, um home sem fé, um pastor que não
prosperou!

A fama é muito mais
perigosa que a tribulação.

Durante a tribulação temos a promessa da
presença e da consolação de Jesus. Nos tempos de fama, o mais provável
que aconteça e sermos assediados por uma multidão de bajuladores,
interesseiros, maus conselheiros e mercadores de todo o tipo. Fato
interessante é que Jesus não só evitava conscientemente como de vez em
quando se retirava estrategicamente das oportunidades de sucesso
principalmente político. A fama deve ser um atributo com um poder
destrutivo tão grande, ao ponto do filho de Deus evitá-la.

Há um exemplo a analisar em Marcos 7:31-36:

“E
ele, tornando a sair dos termos de Tiro e de Sidom, foi até ao mar da
Galileia, pelos confins de Decápolis. E trouxeram-lhe um surdo, que
falava dificilmente; e rogaram-lhe que pusesse a mão sobre ele. E, tirando-o à parte,
de entre a multidão, pôs-lhe os dedos nos ouvidos; e, cuspindo,
tocou-lhe na língua. E, levantando os olhos ao céu, suspirou, e disse:
Efatá; isto é, Abre-te. E logo se abriram os seus ouvidos, e a prisão da
língua se desfez, e falava perfeitamente. E ordenou-lhes que a ninguém o dissessem; mas, quanto mais lhos proibia, tanto mais o divulgavam.”

Pelo
que conheço de Jesus, não usaria de esperteza, proibindo algo para que
conseguisse um resultado eficiente. Por que neste e em outros casos ele
intencionalmente evitava a publicidade? Entre duas interpretações:
evitar a morte prematuramente e estar atento aos perigos da fama, eu
ficou com o segundo.

A fama pode
levar ao orgulho, o pior dos pecados. Aquele que leva homens e
mulheres a afirmar nesciamente que não existe Deus. Para si eles são os
próprios deuses. Que Deus está dentro de cada um, que as ações de cada
um são atos divinos. Quando Elvis Presley tomou contato com a teosofia
ficou confuso e definitivamente desviou-se, ao tornar-se simpático aos
ensinos de seu cabeleireiro, que afirmava que os homens eram parte de
Deus e não suas criaturas.

Deus o criador não
se deixa escarnecer, nem divide conosco a glória que é para Si. Uma das
maiores vulnerabilidades que a fama traz é quanto ao posicionamento das
pessoas. Creio que na mente de um pregador, pastor ou bispo famoso
instaura-se uma confusão inconsciente. A perda dos velhos limites. O
vício de inovar em com a introdução de coisas que parecem bíblicas, mas
não são. As verdades bíblicas não são confusas nem carecem de exercícios
desgastantes para sua compreensão. Arrependimento, fé, humildade e
presença de Deus.

“Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e as
demais coisas vos serão acrescentadas”. “O Senhor é meu Pastor e nada
(de básico) me faltará. “Na minha angústia clamei ao Senhor e Ele se
inclinou para mim, e ouviu o meu clamor.” Mas estas coisas são “simples”
de mais para quem atingiu o “topo”. Os novos “Herodes” querem ser
ouvidos como se tivessem voz de Deus!

E durante a última
páscoa, Jesus tirou as vestes, e tomando uma toalha, cingiu-se. Depois
deitou água em uma bacia e começou lavar os pés dos discípulos. No
final do lavapés, comentou: “Ora, se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os
pés, vós também deveis lavar os pés uns aos outros. Porque eu vos dei
exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também.

Tenho assistido
em minha vida cristã uma sucessão de quedas de grandes homens que se
embaraçaram nos cordéis da fama. Creio que nós humanos temos um fascínio
por ela. Parece que, quando bate a nossa porta, procuramos agarrá-la
com todas as forças. Isso me lembra uma certa leitura de como certos
macacos eram facilmente capturados por uma armadilha muito eficiente.
Dentro de uma cumbuca, era colocado uma pedra brilhante. Aquela
armadilha era deixada no Depois que agarrava o objeto de seu desejo, não
conseguia mais se soltar, entregava sua liberdade por ela.

A fama pode levar um
cristão ao desvario. Ao receber para si a glória que é de Deus, ele
fica à mercê do diabo. É público o testemunho que dou. Certos pastores
no afã de fazer publicidade de suas Igrejas associam curas e milagres de
seus ministérios aos nomes de suas igrejas. Uma vez isto feito, seus
discípulos repercutem aquele erro. Quando vejo algum pregador ou pastor
em grande destaque, principalmente na mídia nacional, preocupo-me. O
sucesso dele faz com que suas atitudes, acentuação de voz e até “as
línguas” estranhas que fala, sejam amplamente copiados. Por exemplo: já
perdi a conta de quantos “charabacandas” tenho ouvido de pregadores.

A fama costuma
produzir uma falsa sensação da aprovação total de Deus. Como na
parábola do rico e do Lázaro proferida por Jesus, em que o rico
acreditava que sua prosperidade era a garantia de uma vida que agradava
a Deus. Em nossos dias a leitura de Romanos 12:16: “Sede unânimes
entre vós; não ambicioneis coisas altas, mas acomodai-vos às humildes;
não sejais sábios em vós mesmos, soa assustadoramente “antiquada”. Da
mesma forma, a ditadura da “lei de Gerson” vem associando virtude a
comportamento de “trouxas”, pois o mundo é dos “espertos.” O arcabouço
dos princípios morais e éticos cristãos, principalmente entre o povo
evangélico aluí-se. E o diabo tem derrubado e, infelizmente, ainda vai
derrubar grandes líderes e os melhores príncipes da palavra de nossos
púlpitos.

Sei que este artigo não
vai mudar o entendimento de quem já tomou a decisão de usar a
publicidade em todas as oportunidades que tiver, para “pregar” o
Evangelho. Mesmo naquelas em que o Senhor não aprove. Saiba
definitivamente que notoriedade e a fama não eram perseguidas pelo
Mestre. Porque orava e consultava ao Pai antes de qualquer decisão ele
sabia quais portas estavam abertas e quais deveria esperar ou evitar. Se
você ultrapassar o limite e saltar o “muro”, Deus não será mais
responsável pelos seus atos nem pela sua ruína. Medite bem: “Pois que
aproveitaria o homem ganhar o todo o mundo e perder a sua alma?” Sem
mencionar o nome de ninguém, “Aquele, pois, que cuida estar de pé, olhe não caia”

SP 20.09.2008/Revisão em 9.1.2016
cruzue@gmail.com

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Esse artigo foi republicado com a permissão de Olhar Cristão