Como família, tivemos uma celebração de Natal excelente. Na igreja tivemos um especial de Natal que também foi muito bom. No dia 25, após um almoço muito agradável em família, tive de levar alguns familiares até a rodoviária de nossa cidade. No caminho, passei tanto por pessoas em seus afazeres, quanto por mendigos e moradores de rua. Um deles, um senhor de cabelos brancos, estava sentado em uma praça, adormecido, com uma garrafa em sua mão, muito provavelmente entorpecido pela substância que havia ingerido. Nesse curto trajeto, mais uma vez fiquei chocado pelo fato de como esse evento, tão central à fé cristã, é hoje ignorado pela grande maioria das pessoas, pelo menos em seu sentido original.
O verniz cristão que cobre nosso calendário pode dar a falsa ideia de que estamos celebrando o nascimento de Cristo, mas, para a grande maioria dos brasileiros, é apenas mais um feriado com forte interesse comercial.
No dia seguinte, li um artigo sobre como o Uruguai eliminou de seus calendários as datas cristãs[1]. Naquele país, o Natal é o Dia da Família, e a Semana Santa é a Semana do Turismo. Por um lado, é chocante saber que, nesse país, as festas cristãs foram descaracterizadas. Por outro lado, a mesma descaracterização, ou quem sabe ainda pior, tem ocorrido em nosso país. Ali não há dúvida: se você quiser celebrar o Natal, este feriado terá uma clara conotação de fé; aqui, comemora-se a festa cristã, mas quase totalmente despida de seu significado. O verniz cristão que cobre nosso calendário pode dar a falsa ideia de que estamos celebrando o nascimento de Cristo, mas, para a grande maioria dos brasileiros, é apenas mais um feriado com forte interesse comercial.
O que é ainda pior é que, com esse ar de cristianismo, muitos acreditam que ainda estão ligados a Cristo. Prova disso é o grande número de cristãos nominais que, nessa data, frequentam cultos e apresentações onde peças teatrais e musicais buscam proclamar o nascimento de nosso Salvador. Esses eventos podem ser espetaculares, em grandes e poderosas igrejas, ou singelos, em pequenas comunidades onde crianças vestidas com lençóis encenam a chegada de Jesus. No entanto, para muitos visitantes nominalmente cristãos, esses momentos têm o papel de “carimbar o passaporte”, ou validar uma fé com a qual sentem alguma ligação emocional ou familiar, mas que não tem nenhuma relevância em suas vidas.
Temo que muitos que hoje se identificam como “evangélicos” são como aqueles vários judeus que, mesmo diante dos milagres e da pregação de Cristo, rejeitam o Salvador no qual afirmam crer (João 1.10-11).
Isso tudo tem me levado à pergunta acima: Cristo nasceu em seu coração? Temo que muitos que hoje se identificam como “evangélicos” são como aqueles vários judeus que, mesmo diante dos milagres e da pregação de Cristo, rejeitam o Salvador no qual afirmam crer (João 1.10-11). Na verdade, o evangelho de João trata em profundidade de várias pessoas que se julgavam piedosas, mas não tinham qualquer conexão com Deus. O primeiro exemplo é Nicodemos, no capítulo 3. Logo no início, João registra que ele era uma “autoridade entre os judeus” (João 3.1). Apesar de seu interesse aparentemente sincero ao longo da conversa, Jesus afirma a seu respeito:
“Disse Jesus: ‘Você é mestre em Israel e não entende essas coisas? Asseguro que nós falamos do que conhecemos e testemunhamos do que vimos, mas mesmo assim vocês não aceitam o nosso testemunho. Eu falei de coisas terrenas e vocês não creram; como crerão se falar de coisas celestiais?’” (João 3.10-12)
O caso de Nicodemos tem um final quase certamente feliz, pois, nas outras duas vezes em que é mencionado, ele parece ter dado passos de fé em direção a Jesus. No entanto, um outro exemplo de uma fé meramente tradicional ou nominal está em João 8, a partir do verso 31: “Disse Jesus aos judeus que haviam crido nele: ‘Se vocês permanecerem firmes na minha palavra, verdadeiramente serão meus discípulos.E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará’”. É evidente que havia algum nível de crença (pois tinham crido nele), mas não era uma fé salvadora! No verso 44, Jesus os confronta afirmando:
“Vocês pertencem ao pai de vocês, o Diabo, e querem realizar o desejo dele. Ele foi homicida desde o princípio e não se apegou à verdade, pois não há verdade nele. Quando mente, fala a sua própria língua, pois é mentiroso e pai da mentira. No entanto, vocês não creem em mim, porque digo a verdade!”
O compromisso, o vínculo desses judeus que haviam crido, era com o Diabo! Isso fica ainda mais evidente quando, ao ouvirem Jesus afirmar que era Deus (v. 58), eles querem matá-lo (v. 59).
É evidente que muitos judeus vieram a crer com o tempo, desenvolvendo uma fé salvadora. Por isso, minha pergunta: Cristo nasceu em seu coração? Você já desenvolveu uma fé salvadora? Talvez você tenha comemorado este Natal, a Páscoa e muitas outras datas, mas, como tantos judeus, sua fé é mais uma concordância intelectual com uma tradição cristã do que um compromisso pessoal de entrega e confiança naquele que pode lhe salvar da justa punição por seus pecados. Nesse caso, eu oro para que, assim como eu, você tenha a experiência de ter um encontro pessoal com Jesus, Senhor e Criador do Universo, mas que também tomou forma humana e nasceu há tantos séculos em Belém da Judeia.
Nota
Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por 5 anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem 4 filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 24º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.