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Censura e Verdade

Chamada

Nos últimos tempos temos sido cercados por uma discussão sem fim sobre censura e fake news. Há até mesmo o famoso projeto de lei sobre as fake news (PL2630), que tem causado tanto tumulto. Por um lado, alguns anunciam que, uma vez aprovada, essa lei será de fato a reinstituição da censura, limitando a liberdade de expressão dos cidadãos. Outros afirmam que grupos poderosos usam as redes sociais para divulgar notícias falsas ou distorções da verdade para promover suas intenções de manipulação da opinião pública. Eu certamente tenho visto muitas fake news promovidas pelos dois extremos ideológicos. Declarações tiradas de seus contextos, afirmações grosseiramente irreais, acusações tecnicamente distorcidas. Nesse âmbito da política e da ideologia, parece valer tudo.

Como cristão bíblico, meu primeiro dever é analisar o que a Bíblia tem a dizer a respeito disso tudo. Muito embora eu possa ter opiniões que vão além da Bíblia, devo reconhecer quando minhas opiniões são apenas isso, opiniões. No entanto, quando a Bíblia é clara sobre algo, devo submeter minhas opiniões à revelação bíblica. Preparei então algumas observações sobre esse tema. Não creio que são exaustivas, mas oro para que possam contribuir para esse debate entre cristãos, e mesmo além deles.

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  1. Deus é a verdade (1João 5.20). Ele não apenas apoia ou promove a verdade. Deus é a própria verdade. Ou seja, não há verdade fora de Deus, pois é ele que define a existência. Assim, a verdade é absolutamente importante nesse debate. Como seguidores de Jesus, é muito importante que atentemos à questão da verdade. Não podemos afirmar que estamos servindo a Deus e, de alguma forma, abandonarmos a verdade.
  2. Toda mentira vem do Diabo (João 8.44). Pode parecer óbvia, ainda mais após a primeira observação. No entanto, é tanto uma implicação direta da observação anterior como um princípio fundamental nesse debate. Mesmo a mentira que nos parece boa ou que promove um ponto de vista que, aos nossos olhos, é santo e puro, ela sempre se origina no próprio Diabo e, portanto, corrompe tudo aquilo que envolve. 
  3. Liberdade de expressão deve ter limites. Muito embora isso possa parecer uma abominação, a Bíblia é clara ao afirmar que não devemos mentir (Efésios 4.25), ou falar obscenidades (Efésios 5.3-4) ou mesmo falar a verdade em situações inadequadas (Efésios 4.29). Dessa forma, a liberdade de expressão não deve ser defendida sem os devidos limites, não pode ser um ídolo. Se defendermos a liberdade de expressão sem limites, teríamos de defender um discurso de pedófilos diante de um grupo de crianças.

Mesmo a mentira que nos parece boa ou que promove um ponto de vista que, aos nossos olhos, é santo e puro, ela sempre se origina no próprio Diabo.

  1. A fé cristã visa a verdadeira liberdade (João 8.32). Somos chamados à liberdade, dentro dos parâmetros da verdade (vide a primeira observação). Isso cria uma tensão com o ponto anterior. Por um lado, devemos afirmar que a liberdade de expressão tem limites, por outro lado, defendemos a liberdade. O padrão de equilíbrio é justamente a verdade. Não é possível que eu exerça a liberdade fora dos parâmetros da própria realidade. Por exemplo, não posso exercer a liberdade de voar como um pássaro, pela simples razão de que não sou um pássaro. Esse simples raciocínio seria uma enorme contribuição na discussão sobre pessoas que se identificam como transgênero.
  2. A Bíblia nos ensina a tolerância quanto a temas secundários (Romanos 14.1-8). Precisamos ser muito seletivos quanto à quais temas vamos combater. Acredito que temos base bíblica para nos posicionarmos quanto a temas como aborto, pedofilia e homossexualidade, só para citar alguns polêmicos. Ao mesmo tempo, temas que costumeiramente têm dividido cristãos deveriam ser tratados com maior tolerância. Isso se aplica a inúmeras questões de estratégia governamental. Temos de tomar cuidado para não elevar ao nível de questões de verdades eternas temas que são secundários, muito embora possamos ter opiniões fortes a respeito.
  3. Por fim, a Bíblia nos exorta a corrigir com mansidão (2Timóteo 2.24-26). Uma marca inquestionável de nosso Senhor Jesus era sua mansidão. O único relato de uma confrontação hostil foi com religiosos que deturpavam o templo, e não com pagãos que tinham padrões de vida imorais. Isso não significa concordar com pecado, mas compreender que nossa postura deve sempre ser na esperança de que Deus conceda o arrependimento.

Uma marca inquestionável de nosso Senhor Jesus era sua mansidão.

Como cristão, eu sempre desconfio dos (e oro pelos) governantes. Desconfio no sentido de que não posso identificá-los com o meu Senhor Jesus, mesmo quando eles afirmam defender os mesmos pontos de vista que eu defendo. Desconfio ainda mais quando vejo governantes que mentem, distorcem a realidade e afrontam a fé cristã. Nesses momentos, eu ouço a exortação do Espírito escrita por Paulo em Filipenses 1.27-29:

“Não importa o que aconteça, exerçam a sua cidadania de maneira digna do evangelho de Cristo, para que assim, quer eu vá e os veja, quer apenas ouça a seu respeito em minha ausência, fique eu sabendo que vocês permanecem firmes num só espírito, lutando unânimes pela fé evangélica, sem de forma alguma deixar-se intimidar por aqueles que se opõem a vocês. Para eles isso é sinal de destruição, mas para vocês, de salvação, e isso da parte de Deus; pois a vocês foi dado o privilégio de não apenas crer em Cristo, mas também de sofrer por ele.”

Sendo assim, olho com muita suspeita esses projetos de lei que propõe a regulação das mídias sociais. Se a sociedade tem sido tão ineficiente contra a pornografia, contra a pedofilia e outras imoralidades, como acreditar que um projeto lei proposto e coordenado por seres humanos que, em geral, não reconhecem a Deus vai promover a verdade?

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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 24º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.

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