Cruzando o Mar da Galileia
João Cruzué
Quero deixar algumas linhas sobre dificuldades de orientação para cristãos já amadurecidos, conhecedores da Palavra, mas insatisfeitos, à procura da Igreja perfeita, diferente, do porto seguro para congregar. Este dilema é bastante comum em nossos dias.
A Igreja do Senhor é perfeita, todavia, constituída de membros imperfeitos que por opção pessoal podem ser lapidados ou não pela palavra. Não sei porquê, mas por duas vezes Ernest Hemingway passou pela minha mente: quando dei título ao post (O velho e o mar) e neste parágrafo, quando lembrei-me de parte daquele prefácio do Livro Por Quem os Sinos Dobram – “Nenhum homem é uma ilha”. Uma tendência ao individualismo, ao isolamento pode produzir uma insatisfação com a própria Igreja. Neste ponto começamos ver no próximo defeitos que na verdade também estão em nós.
Jesus ordenou aos discípulos que cruzassem o “Mar” da Galileia, enquanto ficava para trás, com certeza para orar. Interessante: Se Jesus era Deus por que precisava orar? A resposta era o prazer da comunhão, de estar em contato com o Pai. Mas há um algo didático neste hábito: se o que era Perfeito buscava comunhão, para suas orientações diárias, então, cristãos maduros também necessitam do mesmo hábito para manter viva a mesma comunhão.
Os discípulos corriam perigo de morte e o Senhor os viu em plena luta e os socorreu: entrando no barco e repreendendo o vento e o mar. Há muitos cristãos à deriva açoitados pela força do vento e fúria do mar. O vento das novidades e o mar do secularismo. Ficamos insatisfeitos e esta insatisfação pode ser benéfica ou maligna.
Uma crise pode nos forçar um aumento da sede de comunhão com o Senhor. Neste sentido, é Deus quem nos coloca no barco e manda atravessar o mar. Embora não esteja no barco o tempo todo, ele nos observar atentamente. Isso produz experiência, crescimento e maior comunhão.
Outra crise de insatisfação pode nos açoitar – como a do filho pródigo. Esta não produz nem sede de oração, nem desejo de comunhão com Deus. São olhos que focam apenas defeitos naquilo que observam: excesso de ortodoxia, liturgias adormecedoras, pastores ignorantes, antagonistas em lugar de irmãos, o mundo parece mais interessante que a viver da fé. Aqui mora o perigo.
Não era a “casa” do filho pródigo que era defeituosa. Não havia nada errado com ela. O coração do moço, sim, estava envenenado pelo mundo. Sua insatisfação pessoal o levou ao desvario, ao desperdício e à derrota. As orações do pai – o trouxeram de volta, pois coube a ele o benefício da inexperiência.
A insatisfação de cristãos experientes pode ser mais complexa. Se por um lado é difícil encontrar uma Igreja que possa satisfazer a visão de cada um, por outro o conhecimento bíblico de lidar com a situação já faz parte da bagagem. Se Jesus, que era muito mais experiente e sábio que qualquer cristão maduro resolvia seus problemas de orientação e solidão através de mais comunhão, não há outro caminho senão buscá-la através de orações sinceras.
Jesus era um profundo conhecedor dos corações e da hipocrisia humana não desperdiçava seu tempo anotando defeitos, nem murmurando das pessoas, nem jogando-lhes em face seus pecados. Por que um crente deveria adotar este comportamento tão mesquinho de origem maligna? O diabo sim, quando nos vê, só enxerga coisas ruins. Mas Jesus não ensinou assim: Ele nos vê com olhos compassivos. Ainda que só tivéssemos mil defeitos e apenas uma virtude, é sobre ela que Jesus foca para depois nos animar.
O mar está revolto por causa da fúria do vento? Quem sabe a solução não esteja em abandonar o barco, mas em trazer Jesus para dentro dele? Isto mesmo! Convide o Senhor para estar no barco.
João Cruzué
para o Blog Olhar Cristãocruzue@gmail.com
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Esse artigo foi republicado com a permissão de Olhar Cristão.